conversa informal entre o modelo, o bailarino,
o desportista e o fotógrafo
o desportista e o fotógrafo
o modelo, o bailarino, o desportista e o fotógrafo
sérgio penajoia – agnaldo, quando começou esta tua paixão
pela arte fotográfica?
agnaldo lima – foi em 1986. trabalhava na residência do
embaixador do brasil, em paris, onde tinha como função servir a sua mesa e
cuidar dos salões de recepções para que tudo estivesse impecável ao receber os
convidados. numa dessas recepções estivera presente um famoso fotógrafo
brasileiro, o qual lhe oferecera um livro, posteriormente esquecido sobre um
piano, numa das salas de recepção. era um livro com belíssimas imagens a preto
e branco, as quais mostravam cenas terríveis sobre o efeito que a fome
provocava nos habitantes do continente africano, especificamente na faixa
denominada sahel.
uma daquelas fotos, em especial, tocou-me profundamente, levando-me
literalmente às lágrimas.
naquele momento cheguei à conclusão de que também seria capaz de me
comunicar através da fotografia.
passei, então, nos meus tempos livres, a frequentar a biblioteca do centro
georges pompidou, onde tive contacto com as obras de brassai, robert capa,
eugène smith, dorothéa lange, cartier-bresson e michael freeman, entre outros.
a partir daí, vi muitas exposições e fiz, através da objectiva, o meu primeiro
contacto com as pessoas, os objectos, as formas, a luz e as cores. comecei a
ver o mundo à minha volta com um olhar que até então não experimentara.
imediatamente, optei pelo preto e branco, o que considero ser a elegância
absoluta e intemporal da arte fotográfica.
passados dois anos fui viver em londres, onde resolvi fazer um curso de
fotografia, pois achava que isso seria bom para o meu curriculum. dirigi-me,
então, a uma escola especializada nessa área, em busca de conselhos. o
coordenador de cursos forneceu-me algumas informações, assim como alguns
endereços de escolas, sugerindo-me escolher uma que fosse do meu interesse.
agradeci-lhe e, estava a despedir-me, quando, percebendo que eu tinha um portefólio comigo, manifestou o desejo de o ver. concordei, entre entusiasmado e
preocupado com o seu comentário que possivelmente viria em seguida. para minha
surpresa, após folheado minuciosamente o portefólio, devolveu-mo pedindo-me de
volta todos os endereços que me dera anteriormente e exclamando:
“você não precisa de nenhum curso de fotografia; o que realmente precisa é
aprender a imprimir as suas próprias imagens.”, e, estendeu-me uma tira de
papel com um novo endereço, em cuja escola sugeriu que me inscrevesse apenas na
disciplina de impressão de imagens (laboratório) visto que eu já possuía um
estilo próprio e não deveria permitir que nenhuma escola o destruísse,
impondo-me novas regras, novos conceitos. aquilo soou aos meus ouvidos como se
tivesse a receber um prémio por todo o meu trabalho autodidacta contido naquele portefólio.
foi assim que me inscrevi no camden adult education institute, onde tive
uma única aula teórica (em como revelar um filme). todo o curso girou em torno
da prática de laboratório (revelação de filmes e impressão de imagens).
foi nessa escola que, ao final do curso fiz a minha primeira exposição
colectiva (1989).
certamente, a partir daí, não segui
os passos da temática daquele livro, encontrado alguns anos antes sobre o
piano, mas propus-me, através do meu trabalho fotográfico dar um pouco mais de
beleza ao mundo e partilhar dessa beleza com aqueles com quem convivo
diariamente. tanto que o meu prazer maior, no que se refere a fotografia
abstracta, é transformar coisas feias em belas, tendo como sujeito eleito para
essa transmutação o lixo, os objectos e as superfícies danificadas e em
decomposição. dois exemplos que elucidam essa idéia são as exposições “a alma das coisas” (1995), “a cor do tempo”
(1998) e “metamorfose de um olhar” (1999).
contudo, fascina-me, também, fotografar o ser humano, nas suas diferentes
actividades diárias, cujos exemplos foram vistos nas exposições “poesia urbana” (2003), “caras giras” (2004), a segunda parte - ...e outras almas - de “poesia a preto e branco a alma das coisas e outras almas” (2007).
por isso a razão deste projecto – um corpo... um espaço... e fez-se
movimento – para o qual tive o privilégio de que aceitasses participar.
Ufa!... quase que não mais parava de falar. Desculpa! (risos)
sp – (risos) quando pegas numa máquina fotográfica, o
que sentes? o que sentes instantes antes de fazer o click para captar a imagem
que vês?
al – bem, aí são duas perguntas... (risos) portanto, duas respostas...
resposta à tua primeira
pergunta:
sinto-me como se estivesse a apanhar um avião rumo a um lugar onde nunca tenha
estado antes, mas onde sempre desejei estar. é, ao mesmo tempo, um sentimento de liberdade e de aventura;
creio ser algo assim como se sente quando se dança.
resposta à tua segunda
pergunta:
sinto-me igual a uma criança que, tendo nas mãos um brinquedo o qual lhe
permita tornar o mundo mais belo, mais alegre, mais feliz e, sabendo disso,
sente em simultâneo a responsabilidade do click; esse click deve ser
conscientemente construtivo em prol de um mundo melhor. depois, solta-se a
respiração, até então presa, e parte-se para um novo momento, como se se
tivesse acabado de dar à luz algo muito especial.
sp – que preparação um
fotógrafo tem de ter, para ter aquele olho clínico e captar algo normal do dia
a dia e transformar em uma fotografia profunda e linda?
al – antes de tudo deve ter alguns atributos tais
como, uma boa objectiva para se conseguir uma boa definição da imagem, um bom
conhecimento técnico no uso do seu equipamento, a percepção sobre a qualidade e
o uso da luz, ter tempo disponível para analisar de diferentes ângulos (quando
possível) o sujeito a ser fotografado, ter sensibilidade e senso estético na
composição da imagem, usando, acima de tudo a sua emoção, fotografando para si
próprio mas com a responsabilidade de que outros irão ver tal imagem e que
essa tem um fim único, tocar a emoção
das pessoas, mediante o sentimento ao qual o fotógrafo se propõe.
concluindo, deve-se ter um olhar educado, analítico e atento sobre as
coisas nos seus mínimos detalhes.
semelhante à dança, tem-se que ter um controlo absoluto sobre cada fase
daquele momento para que o resultado
seja equilibrado, harmonioso, positivo.
sp – como te descreves
enquanto fotógrafo?
al – como um visionário, um sonhador, onde o que faço
como fotografia não se destine exclusivamente a ter um retorno financeiro. é
claro que essa parte é muito importante pois permite desenvolver novos
projectos, numa área em que equipamentos, acessórios e materiais são
extremamente caros. mas não é o principal. dá-me imenso gozo a reacção de quem
vê as minhas imagens. gosto de sentir a emoção estampada no seu olhar, assim
como se a função da minha fotografia fosse trabalhar a emoção, massajando-a de
forma calma, leve, suave, sem incomodar. algo assim como um acompanhamento
físico durante um treino, quando o pt preocupa-se com o bem estar da pessoa que
está a treinar.
isso faz-me ver a fotografia como um acto de amor, amor pela natureza, amor
pelo próximo, amor pela vida.
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